Há pouco mais de 6 anos eu comemorava a perda de 10% de peso. Cheguei a perder quase 25% de peso naquela época. Sim, eu sei da história de “quem perde acha”, aliás eu achei. E ainda achei quase 10% a mais do que tinha quando comecei. Mas às vezes as pessoas enchem demais o saco com a escolha das palavras… por mais que faça sentido.
Há uns 5 anos eu atingi um platô e fiquei com o peso relativamente estável. Apesar de não ter atingido minha meta, estava próximo e minha qualidade de vida havia aumentado muito, muito mesmo. Eu conseguia pedalar, dormia melhor, tinha mais disposição etc e tal. Aí eu dei uma relaxada e fui curtir a vida. Continuei praticando esportes, mas com menos intensidade. Aí a vida te puxa pra lá e pra cá. Mudanças no trabalho, na vida pessoal, novos compromissos, e por aí vai. E me descuidei um pouco, e fiquei lá nos meus 20% a menos de peso. Ainda era bom. Um dia tive um gripe forte, da gripe veio uma amigdalite e disso veio uma pericardite. Nada grave, mas dor no peito realmente assusta e você realmente é atendido rapidamente no hospital quando chega com uma dor assim. O tratamento era apenas Ibuprofeno…. e repouso. Nada de exercício por uns 2 ou 3 meses. Aí fui pra lona, e desandei de vez.
Comece caminhando
E a vida mudou muito, de lá pra cá. Em vários sentidos. E chegou a hora de colocar o corpo como prioridade novamente. Desta vez não seria tão fácil, momentos de vida diferentes, responsabilidades diferentes, ritmo de vida diferente. Novamente o ciclo começou caminhando. Caminhar tem um efeito fantástico na vida: você se coloca em movimento, sai da inércia.
Quando você se coloca em movimento, é como se você ganhasse pelo menos uma grande queda de braço. A gente conhece muitas vezes o que precisa fazer, mas não faz. A gente procrastina. Eu tenho uma capacidade enorme de realizar o que precisa ser feito agora, mas também de deixar para depois de amanhã tudo aquilo que você não precisa fazer obrigatoriamente amanhã.
Romper a barreira da inércia tem um poder incrível. É uma metáfora para a vida. Comece com algo que você pode fazer hoje. Com algo que não depende de um exame, uma roupa, um dia perfeito, alguém, um lugar, uma força sobre humana. Comece caminhando. Se você conseguir caminhar por 30 minutos, você deu o primeiro passo importante, você rompeu a barreira da inércia.
Acho que toda pessoa que se propõe a fazer grandes mudanças na vida, deveria começar caminhando. Caminhar não emagrece quase nada, caminhar não define os seus músculos, caminhar não aumenta sua capacidade pulmonar, caminhar lhe coloca em movimento. E ao se mover, lentamente, sem gastar uma quantidade absurda de energia, você ganha um novo espaço privilegiado na sua vida. Como dizia Merli, o espaço dos peripatéticos, daqueles quer se colocam num momento de reflexão privilegiada. Ao caminhar você observa o mundo se movendo ao seu redor lentamente. Vê as pessoas, os lugares, a paisagem se mexerem lentamente. Seu corpo não está 100% tomado pelo esforço de caminhar, há espaço para pensar, para prestar atenção em tudo. Você poderá descobrir coisas novas sobre lugares em que passou muitas vezes antes. Você poderá descobrir novos lugares, novos personagens por onde passa. E você irá dialogar consigo mesmo. Sobre a mudança que já começou na sua vida.
Dieta
Caminhar é como um prólogo, um prefácio de algo que está para realmente começar. Não emagrece, apenas lhe coloca predisposto a começar a longa maratona que vem pela frente. E a coisa começa a funcionar de verdade quando você decide cuidar da sua saúde fazendo um bom checkup e indo num bom nutricionista. Eu comecei pela nutricionista, depois cardiologista e por fim um endocrinologista.
Comecei pela nutricionista. A palavra dieta tem significados ambíguos para cada um. Emagrecer muito rápido não é algo saudável. A não ser que você tenha feito uma cirurgia bariátrica ou tenha uma condição de saúde muito específica, você não deveria emagrecer muito rápido. Um bom nutricionista saberá lhe recomendar algo que sirva para o seu paladar e a sua rotina. Uma alimentação saudável e equilibrada responde por 80% do esforço para perder peso. E você precisa fazer isso por um longo período, não por um mês. Então você precisa de algo que seja viável. Dietas radicais engordam, e muito.
Minha nutricionista é fora de série. Tenho consulta 2x por mês e pesagem toda semana. Me pediu uma bateria enorme de exames antes de receitar qualquer coisa. Conversa muito comigo. Cada consulta leva entre 30 e 90 minutos. Até foi no mercado comigo me ajudar a comprar algumas coisas. Não, o convênio não cobre. Não, não é barato. Mas se você quer emagrecer e não engordar novamente, você precisa mudar os seus hábitos. Caso contrário, fará uma dieta e depois retomará aos velhos hábitos, e vai engordar numa velocidade impressionante.
Não vou aqui discutir o tipo de dieta que eu estou fazendo, pode ser que não seja adequada para você. Existem mil fórmulas diferentes e mil interpretações. O que eu faço é discutir com a minha nutricionista, reavaliar o que não dá certo. E aos poucos a minha nutricionista vai me passando novos exercícios, introduzindo novos hábitos que espero que perdurem na minha vida, mesmo depois de atingir a minha meta. Se você não tiver consciência disso e não estiver disposto a fazer mudanças de longo prazo, então irá fazer como eu que perdi muito peso e engordei ainda mais depois. Quer apostar?
Exercícios
Exercícios são importantes, não tanto como mudar seus hábitos alimentares, mas ajudam muito. Ajudam a aumentar o consumo calórico claro, mas ajudam antes de mais nada a você não surtar. Diminuir o consumo de açúcar, carboidrato e gordura na sua vida não é algo simples. A comida está ligada não apenas ao instinto de sobrevivência, está ligada ao prazer. Tirar o prazer da sua vida tem um impacto brutal no seu estilo de vida. O exercício físico contínuo e frequente vai lhe trazer um pouco desse prazer de volta, vai ajudar a equilibrar a sua vida e será uma forma importante e lhe proteger um pouco da compulsão alimentar. Eu caminho atualmente 5 ou 6 vezes por semana, entre uma e duas horas por dia. No dia em que eu não caminho, minha alimentação piora nitidamente. O corpo precisa de descanso. Acho que as pessoas que fazem exercício 7 dias por semana e não conseguem parar tem problemas, sério. Mas fazer exercício 2 vezes por semana também não resolve. Não adianta fazer um exercício muito leve, você deve impor um certo ritmo. Antes de apertar o passo, você tem que ter um OK do seu cardiologista, faça todos os exames. Antes de ter um OK, pegue leve. Você pode ter que ir num ortopedista ou num endocrinologista também.
Depois de um tempo caminhando quase todo o dia, comecei a ir na academia. Por N motivos, você precisa fazer algum tipo de exercício de força, além do exercício cardiovascular. Se você já faz exercício cardiovascular, ótimo, mas tem que fazer exercício de força sim. Senão você corre o risco de emagrecer e perder musculatura junto, o que pode ser bem perigoso. Então é isso, tem que fazer. Tem que fazer os 2: exercício cardiovascular (como caminhar, correr, pedalar, nadar) e exercício de força.
Eu sei que tem gente que adora academia. Admiro muito essas pessoas, mas eu não sou uma delas e sei que muita gente odeia academia. Os motivos são muitos: é quente, a música é horrível (pra mim), as pessoas são lindas e saradas enquanto você parece o tio sukita que saiu errado, os exercícios são chatos, etc, etc, etc. Existem academias diferentes sim. Já fui em academia diferente que toca rok’n roll, com gente mais velha e menos selfies por minuto, sem muitos espelhos e você não se sente uma vitrine virada para a rua, como se quisesse se exibir para o universo do Instagram ao vivo. Mas dessa vez a minha nutricionista me recomendou um tipo completamente diferente de academia e me recomendou ir apenas 2 vezes por semana nos primeiros meses, e é o que eu estou fazendo. A diferença lá é que não são exercícios feitos em máquinas, você fica descalço o tempo todo, trabalha o equilíbrio, o alongamento, a postura, etc. E tem um acompanhamento bem de perto. Sim, é mais caro. Mas é bem seguro, equilibrado e eficiente. E lá estou eu.
Remédios
Eu gostaria de fazer um alerta sobre o endocrinologista. Eu sou filho de médico e convivi com histórias de médicos a minha vida toda, então a gente acaba descobrindo uns macetes. Minha nutricionista me recomendou tomar um remédio simples e barato, dizendo que iria me ajudar muito com a minha condição de resistência insulínica. O meu endocrinologista disse que a indicação da minha nutricionista era totalmente irrelevante me me recomendou um outro remédio injetável que seria muito mais eficaz. Claro que eu não tomei o remédio injetável. Eu passei a vida vendo meu pai tomando injeções diariamente (ele era diabético juvenil) e nem passou pela minha cabeça tomar aquilo. Quando comentei com a minha nutricionista, ela sacou o remédio da gaveta e me mostrou que ele era uma versão 4x mais cara de um remédio idêntico com uma leve mudança na embalagem. Também li sobre o princípio ativo do remédio e consultei mais 2 médicos amigos sobre a indicação do meu endocrinologista. Resultado: não vou ajudar o cara a ir para um congresso no Havai me receitando remédios caríssimos que podem agravar o meu quadro de resistência insulínica ao invés de melhorar. O remédio indicado até me ajudaria a emagrecer, mas o custo para a minha saúde e para o meu bolso seria altíssimo.
Já o remédio que a minha nutricionista recomendou, é super comum, barato e sem contra indicações. Estou tomando ele, não para emagrecer, e sim para cuidar de um problema de saúde, a resistência insulínica. Mas eu acho que tomar remédios para emagrecer é algo complicado. Já tomei sibutramina antes e não achei algo bacana. Eu sei, toda ajuda é bem vinda… mas pense bem antes de ir atrás de soluções milagrosas, pesquise bem e fique atento aos efeitos colaterais. E claro, não tome medicação sem recomendação médica.
Terapia
Eu sei que muita gente ainda tem preconceito contra terapia (ou análise, como preferir). Mas é fundamental. Aqui entra a ação de longo prazo. Eu digo que a minha nutricionista é a minha segunda terapeuta, mas eu tenho a primeira. E a primeira é importante. Comer é algo importante na sua vida. Lhe dá prazer, aplaca o stress, cura as dores da alma. Chocolate, cerveja, quindim, sorvete, churrasco, comida de boteco, tudo isso é vida. Eu costumo dizer que o amor engorda. A maioria das coisas que os casais gostam de fazer (além de sexo) engorda.
As coisas que você faz na vida, o seu trabalho, o seu sono, os amigos, os amores, tudo tem a ver com a comida. E se você quer perder muito peso como eu, então algo no caminho não deu muito certo. Você precisa parar e reavaliar a sua vida. Mudar o que te faz buscar na comida um abrigo seguro. Você não vai tirar o prazer da comida, mas vai ter que perder a compulsão pela comida. E a compulsão é sim um troço ruim que vem de uma dor, uma ansiedade, uma angústia, um stress da sua vida
E aí entra a terapia. Quais são os seus gatilhos? O que você pode fazer para não repetir os mesmos erros? Quais hábitos você precisa mudar? Ao que precisa estar atento? Não estou aqui falando de um processo de “treinamento”, de coaching. Estou falando num processo de revelação, de cutucar as suas fraquezas e as suas dores. Sim, a comida está relacionada com tudo isso. A frase “Mens sana in corpore sano” poderia tranquilamente ser escrita ao contrário. Corpo são em mente sã. Eu acredito muito na capacidade da terapia em promover mudanças positivas na sua vida. É um movimento lento, às vezes doloroso, mas o autoconhecimento não tem preço. Mas como tudo na vida, terapia não é milagre e nem funciona assim logo de primeira. Pra mim, funciona se, e somente se:
- Você tem empatia e uma conexão com o terapeuta ou a tal da transferência. Você precisa se sentir confortável para falar de assuntos delicados com ele. Então se não houver esse movimento, não vai funcionar. É como ir ao médico e esconder informações fundamentais para o diagnóstico. Se não rolou com seu terapeuta depois de um tempo (eu diria no mínimo um mês), tente outro.
- O terapeuta não deve lhe dizer o que fazer, ele deve lhe conduzir para que você mesmo forneça as suas respostas. Se o terapeuta começar a colocar os seus valores pessoais na terapia. Levante e procure outro
- Terapeuta não está lá pra alisar a sua cabeça, não é travesseiro nem um lugar confortável. Não é alguém para lhe ouvir e dizer que tudo vai ficar bem. Terapia serve para se conhecer. Conhecer o outro é moleza, conhecer a si mesmo nem sempre é divertido. Às vezes é bem doloroso. Ter que admitir seus erros e reconhecer seus fracassos e limitações não é algo fácil. Se o seu terapeuta lhe dá colo por muito tempo, algo não está bem, próximo.
Um longo caminho
Por fim, tenho clareza de que o problema maior não é emagrecer. Emagrecer dá um puta trabalho. É um esforço enorme de dinheiro, tempo e sobretudo energia. Desistir no caminho é muito fácil mesmo. Porém, mais difícil do que emagrecer é levar uma vida saudável depois de perder peso. É não voltar a engordar. Emagrecer não é perder peso, emagrecer é melhorar a sua qualidade de vida em vários aspectos. É saber fazer escolhas saudáveis todos os dias, é saber que você pode comer o que gosta, só não pode fazer isso o tempo todo ou em grandes quantidades. É saber não mascarar os seus problemas com coisas que lhe dão prazer. É saber que você precisa praticar exercícios com alguma regularidade para o resto da sua vida. É saber se cuidar e observar como o seu corpo se comporta sempre. É se permitir sem se destruir. Isso é o trabalho de uma vida… quem sabe uma vida onde no final do caminho, seja uma vida de erros, acertos, mas sobre tudo uma vida de constante aprendizado.