Semana passada completei meus 48 anos de vida. 48 translações em volta do sol. E aqui no meio da terça-feira de carnaval, em meio ao respiro do trabalho, resolvi parar um pouco para fazer uma daquelas retrospectivas que as pessoas adoram fazer no final do ano. Estive adiando por um bom tempo este momento. Sim, procrastinar é uma arte que eu domino bem, mas não é só isso. Há coisas que por um bom tempo não tive coragem de escrever, mas acho que chegou a hora.
Gostaria de voltar um pouco mais no tempo e retomar o ano de 2020, no começo da pandemia. De uma forma ou de outra, a maioria de nós fomos afetados. No começo, a Timbira teve uma forte queda do faturamento, pois nossos clientes estavam sem dinheiro. Mas nós não paramos de trabalhar um minuto. Muito pelo contrário, investimos mais e fomos para cima. E logo a área de TI começou a bombar, a Timbira se viu num ritmo de crescimento acelerado. No segundo semestre começamos a procurar novas pessoas para trabalhar conosco. E a equipe foi aumentando.
Ainda em 2020, no final daquele ano eu me separei. Não vou discutir aqui os motivos para isso, mas naquele momento eu julguei que era a melhor coisa a se fazer. Hoje eu certamente vejo diferente… No começo de 2021 eu estava lá meio perdido com o resultado da separação, enquanto a Timbira vinha crescendo. E lá por março meu sócio pegou COVID e ficou bem mal. Nesse momento eu tive que tomar as rédeas da empresa. E foi nesse momento que decidimos dar um salto. Com a vinda de mais gente, a empresa passou a se estruturar direito. Processos, ferramentas, documentação, uma série de coisas que antes nós deixamos num segundo plano, agora eram vitais para trabalhar com uma equipe maior. Só que até toda essa equipe nova entrar nos trilhos, o volume de trabalho foi só aumentando. No final de 2021 eu precisava urgentemente parar, descansar. Mas tive que adiar este momento aqui e ali, até algumas coisas se acomodarem. E aconteceu o pior: eu comecei a surtar. Não que meu temperamento normalmente já não seja complicado, veja bem. No entanto, eu estava muito pilhado e tive uma atitude bem ruim com um cliente.
Tirei uma semana de folga pouco tempo depois deste incidente. E chegou a hora de procurar um psiquiatra que me recomendou um antidepressivo. No começo parecia tudo bem, mas logo vieram os efeitos colaterais e resolvi parar de tomar o remédio. Nesse momento, apesar de todo o trabalho para construir a empresa, eu já não me encaixava bem nas novas formas de trabalho da empresa. E veja bem, a empresa evoluiu muito e eu acreditava e continuo acreditando: o novo modelo é infinitamente melhor. Então por que eu não consigo me encaixar direito? Em 2022 eu fui num neurologista e depois de alguns exames e algumas consultas ele me diagnosticou com TDAH: Transtorno de déficit de atenção com hiperatividade. Antes de fechar diagnóstico eu fui pesquisar um pouco sobre o assunto e principalmente pesquisar sobre o meu passado. Falei inclusive com a minha mãe. Ela me disse que quando eu era criança eles notaram algo diferente e me levaram no médico, mas este tipo de diagnóstico não existia naquela época. E muita coisa passou a fazer muito sentido.
Passei a tomar ritalina. Embora eu não sentisse muita diferença, aos poucos a vida passou a ganhar mais fôlego e eu estava trabalhando melhor. Até que resolvi voltar a me cuidar, caminhar e depois voltei para a academia. Aí a coisa complicou. Quando eu tomava ritalina e fazia exercícios, sentia o corpo tremer e um pouco de palpitação no coração. Resultado, parei com os exercícios e parei com a ritalina. De volta a estaca zero. Já no meio do ano procurei uma nutróloga, ainda nessa pegada que querer me cuidar e perder peso. Ela me passou um catatau enorme de exames para fazer. Uma maratona. Mas estávamos às vésperas do PGConf.Brasil e não dava pra parar tudo para cuidar disso. Então, só depois do PGConf.BRasil e depois de fazer muita trapalhada pelo caminho, eu tirei quase um mês em setembro para me cuidar.
Fiz tudo quanto é tipo de exames, voltei para a academia, voltei no neurologista, fui ao cardiologista, pneumologista, otorrinolaringologista, gastroenterologia, endocrinologista, ortopedista e claro, na nutróloga. E depois do resultado dos exames…. mais exames, claro. E todos disseram mais ou menos a mesma coisa: olha, não está tão ruim, mas temos alguns problemas aqui. Eu poderia receitar um tratamento para (leia-se aqui um monte de coisas que foram encontrando), mas se você perder peso, vai tudo voltar naturalmente ao normal. Em outubro comecei finalmente a dieta nova, com apoio do famoso Ozempic. Um mês com 0,25mg, depois um mês com 0,5mg e depois 1mg. Junto com o Ozempic vieram outros acompanhamentos, o Glifage, vitaminas, rosuvastatina, etc. A cada bimestre, uma nova bateria de exames de acompanhamento antes da próxima consulta com a nutróloga. Os primeiros meses da dieta foram horríveis. Eu tive um mau-humor insuportável. Teve um dia em que fui ao supermercado e tinha vontade de chorar. 80% do que existe no mercado eu não posso nem passar perto. Hoje estou bem mais adaptado e acostumado. Não dá pra dizer que é totalmente tranquilo. No entanto, se você não mudar o seu estilo de vida, é certeza que vai voltar a engordar quando parar a dieta. Não recomendo para ninguém tomar remédios para emagrecer sem acompanhamento de um bom profissional de nutrição (eu acho que um nutrólogo é uma opção mais cara, mas bem segura também) e terapia. O tripé eu já comentei aqui antes: dieta, terapia, exercícios. Os 3 tem que andar juntos. Eu confesso que sempre fui resistente com esse negócio de tomar remédio para emagrecer, mas cheguei num ponto em que não posso mais falhar. Agora tenho que ir até o fim e recuperar uma vida saudável. Era isso ou partir para opções mais agressivas como balão gástrico ou cirurgia bariátrica. Eu realmente espero não precisar disso.
E as coisas melhoraram mesmo, os exames parecem, em geral, muito melhores. Alguns ainda não estão perfeitos, mas sem dúvida bem melhores. Tive também que tirar por um tempo o pé do acelerador com os exercícios, devido a um inchaço no joelho. 30 sessões de fisioterapia para fortalecer a musculatura e proteger o joelho. Perdi quase 25% de massa corpórea até agora. É muita coisa sim. Mas ainda estou bem longe do objetivo. Saí de Obesidade mórbida, grau III para grau II. Em março devo chegar no grau I. O objetivo é ficar no máximo com sobrepeso. Mas essa não é toda a história. Quando você perde muito peso, você perde também muita massa magra. No primeiro bimestre eu perdi 50% de massa magra e 50% de gordura. No segundo bimestre eu consegui perder menos massa magra proporcionalmente. Hoje eu tenho 60% de massa magra, a meta é atingir 75%. Isso está longe de ser algo simples de fazer.
Outra coisa que aconteceu em outubro é que eu me afastei das operações da Timbira. Passei a me dedicar a criação de conteúdo para cursos em vídeo. O primeiro, o curso sobre backup eu terminei de produzir no começo de dezembro. Mas minha capacidade de trabalho nesse ponto estava bem reduzida. Não conseguia mais trabalhar 8h/dia. E isso é um problema que permanece até agora. Por um lado esse período me permitiu ter tempo para me cuidar, por outro lado, me deixou mais isolado com o mundo. O que me trouxe novas reflexões.
Em dezembro de 2022, em me encontrei num momento muito ruim. De isolamento, de solidão. E tive que lidar com alguns temores que sempre me rondaram, entre eles a solidão. Eu tive momentos na vida de convívio muito intenso com alguns bons amigos. Também tive momentos incríveis com grupos de pessoas em momentos muito especiais da vida. Mas estes momentos especiais foram relativamente pontuais. A verdade é que na maior parte da vida eu me apoiei em pouquíssimas pessoas e sempre tive um círculo de amizades muito reduzido. Os relacionamentos amorosos passaram a ser um lugar para se apoiar e a internet foi um lugar para conseguir isso facilmente. Conseguir atenção, conseguir companhia, conseguir outras coisas também, claro. Mas eu decidi romper essa minha relação com aplicativos de paquera. Apesar de ter conhecido pessoas muito legais por este meio, eu senti que minha vida precisa focar em outras coisas. E que muito além de paqueras, eu preciso de novos amigos, de conviver com pessoas em novos espaços. Mas em dezembro, eu quase não consegui trabalhar.
Boa parte destas reflexões surgiram da terapia com a minha psicanalista. Eu também procurei em setembro de 2022 uma psicóloga especialista em Terapia Cognitivo Comportamental, especialista em TDAH. Foi horrível. Depois de poucas sessões e uma conversa no estilo “positividade tóxica” eu fechei a conta. Em dezembro eu finalmente pude voltar a tomar remédio para o TDAH, o Venvanse. Eu estava ansioso por isso. Tive que esperar um tempão pra começar, por vários motivos que foram adiando isso. Mas o efeito pra mim foi praticamente nulo. Consta que esse remédio tem efeito meio imediato. Pra mim não fez diferença. Eu também havia entregue o primeiro curso em vídeo, agora tinha um novo curso para começar. Por mim, depois de muito pensar e sentir, tentei reatar com minha ex mulher, de quem eu havia me separado no final de 2020. Na verdade não deu muito certo, por N motivos.
E no final de dezembro eu voltei ao mesmo psiquiatra que um ano antes havia me receitado um antidepressivo que não deu muito certo (e eu sumi depois disso). Ele apostou num novo diagnóstico que me assustou um pouco: transtorno bipolar. Passei a tomar mais uma medicação, o lítio. Um belo coquetel de remédios diariamente. Ao mesmo tempo, tomei algumas decisões no final do ano, das quais decidi não escrever em nenhum lugar na época: decidi colocar em prática:
- Decidi começar a fazer aula de dança, algo que eu sempre tive vontade, mas sempre tive vergonha
- Voltei a fazer trilhas, ir em cachoeiras e atividades do tipo, se possível em grupo de passeio, para conhecer novas pessoas
- Comecei a fazer Terapia Cognitivo Comportamental com outra pessoa, presencialmente, e desta vez parece que acertei
- Voltei a atender clientes na Timbira. Agora eu divido meu tempo entre atender clientes e produzir conteúdo para os cursos
- Voltei a procurar eventos culturais na cidade
A ideia aqui é me integrar mais com pessoas. Sair mais de casa. Trabalhar em casa e morar sozinho pode ser bem complicado se você não se relacionar com outras pessoas. Infelizmente as coisas não mudam de uma hora para outra, mas estou tentando. Comecei meio afobado como sempre, depois mais devagar como esperado, mas estou tentando e insistindo.
Tenho visitado mais novos e velhos amigos. Afinal, tenho amigos que conheço há mais de 30 anos. Cultivar estas amizades é tudo de bom. Mas entrar em novos espaços não parece fácil. Eu sou uma pessoa difícil, implicante, que fala demais. Mas tenho que mudar um tanto isso também. Estou tentando ser uma pessoa melhor. São muitos desafios. Espero ser um colega de trabalho melhor, um amigo melhor, um namorado melhor, quem sabe um dia um marido melhor. Espero poder estar sempre de peito aberto, ter relações transparentes. Construir espaços onde nós possamos nos se sentir confortáveis, seguros. E que essa construção seja permanente, que estejamos sempre revisitando e entendendo como nos sentir melhor dentro destes espaços, dialogando e refazendo acordos.
Eu nem imagino a paciência que a equipe da Timbira tem que ter comigo. É duro perceber que tem errado e pior, que na maior parte do tempo nem perceber que tem errado. Remédios podem ajudar em momentos de crise, mas no dia-a-dia, sou eu mesmo que tenho que colocar mais energia em cada ação, ter mais atenção antes de falar, ouvir o outro, deixar de procrastinar as tarefas assíncronas e por aí vai. Eu sei que posso ser uma pessoa terrível em momentos ruins. Mas em algum momento, imagino que deva ter acertado em algumas coisas. Sabe, temos que contratar pessoas melhores que nós mesmos para trabalhar conosco. Nisso eu acho que acertamos bem. Sim, não acertei sozinho, claro. De qualquer forma, eu fiz parte disso. Já ajudei muitos clientes da Timbira e espero ajudar muitos pela frente. Espero aprender muito com o time da Timbira por um bom tempo. E espero muito mesmo, ser reconhecido como alguém capaz de contribuir neste novo momento da empresa. Não vou deixar de ser uma pessoa solitária de uma hora para outra. Não vou deixar de ser ansioso num passe de mágica. Provavelmente nunca vou deixar de ficar exausto e me dispersar em uma reunião com 3 horas de duração. Não sei se vou voltar a conseguir lidar com lugares com barulho vindo de vários lugares ao mesmo tempo sem querer fugir dali. Espero poder moderar meus momentos de rompantes, e perceber a tempo que estou falando alto demais. Seria muito bom deixar de fazer falas inadequadas em momentos inadequados…
Acho que muita coisa a gente aprende na vida. Outras a gente disfarça ou evita. E outras a gente abraça e convive mesmo. Ainda tenho um longo caminho pela frente. Muita terapia, muita reflexão, peso pra perder, muito exercício e muita vida pra viver, amigos para celebrar e quem sabe o amor venha me encontrar numa esquina da vida por aí. A vida já não é mais no mesmo pique de 10 anos atrás, a idade vai chegando e as limitações vão aparecendo. É hora de ter mais paciência e perseverança. Sempre foi hora disso.
Parabéns pelo relato! Curioso como sua história parece bem com a minha, em vários aspectos. Quando falou em procrastinar, o alarme tocou na hora: TDAH! E é assim mesmo, isso afeta nossa vida em todos os aspectos, a eterna jornada de começar e não terminar, adiar o enfadonho em prol da dopamina. Estou tb na terapia, mas ainda não me convenci a tomar o remédio, vamos ver se coloco as coisas no eixo sem ele. E sim, voltar a exercitar e visitar os velhos amigos está na lista de prioridades.
Espero de verdade que consigas se equilibrar nessa balança delicada, força de vontade tu já tens!