https://www.youtube.com/watch?v=L_j-tpmdPlI
Cumprindo a minha promessa de 10 anos do SAVEPOINT, segue o primeiro post encomendado, só que este não é técnico, vem de um grande amigo que a beira de seus 40 anos, vai ser pai pela primeira vez e logo de gêmeos!
A primeira coisa que eu acho realmente importante para quem vai ser pai ou mãe é que sinceramente, eu prefiro não fazer muita distinção entre pai e mãe – salvo raras exceções óbvias como amamentação e coisas em que biologicamente não tem como trocar os papeis. Se você acredita realmente que pai e mãe tem papeis completamente distintos, volte para a sua caverna…. hoje é comum ter mulheres que ganham melhor que os maridos e está tudo bem. Depois que o filho nasceu e foi amamentado (por favor insistam na amamentação, é sério, o único mamífero que nasceu para tomar o leite de vaca é o bezerro mesmo, não importa o que o comercial da Parmalat ou da Nestlé digam) pai e mãe podem trocar de papeis à vontade. Se não acredita, a antropologia e a história estão aí com inúmeros exemplos para mostrar que certas regras só existem na nossa cabeça.
Dito isso, é preciso que se repita sempre: ter filhos não é sinônimo de felicidade. Aquela fórmula de que você precisa arrumar um bom emprego, casar e ter filhos para ser feliz é uma grande balela. Depois que os anticoncepcionais se tornaram uma realidade acessível e aceitável para todas as pessoas civilizadas (os que são contra anticoncepcionais, por favor, parem de ler aqui e vão se ocupar com sua caverna) ter filhos se tornou uma opção. Toda vez que eu encaro um engarrafamento monstruoso eu penso que a sobrevivência da espécie não depende mais de termos muitos herdeiros, e sim de ter menos pessoas pressionando o consumo dos nossos escaços recursos naturais. Então se você não quer ter filhos, além de ter mais tempo e dinheiro para viajar e se divertir, você também está sendo ecologicamente correto. Mas de qualquer forma, se cada casal tiver um ou dois filhos, estaríamos mantendo a população atual e não aumentando… o que já seria bem razoável. Conheço casais que decidiram não ter filhos e são muito felizes, muito mesmo. Claro que passou pela cabeça deles terem filhos, mas optaram por não ter e vivem muito bem com isso.
Mas vocês decidiram ter um filho. Eu sei que sempre quis ter um, já novo eu sabia que queria ter um. Se tive no momento certo ou com a pessoa certa, é outra questão. Mas sempre quis ter um. Se você teve a sorte de conhecer alguém, casar com ela, viver anos com essa pessoa e depois decidirem juntos que querem ter filhos naquele momento da vida, meus parabéns! Fico feliz quando conheço histórias assim. Vocês já deram um grande passo. Seu filho deve nascer um ambiente bem mais tranquilo. Agora, se seu casamento está de mal a pior e você acha que um filho vai ajudar a unir ambos, não sabe o tamanho da encrenca em que está se metendo. A separação vai ser bem mais dolorosa depois. Pais separados são algo para lá de corriqueiro hoje em dia. Não é um bicho de 7 cabeças. Eu sei que você sabe, mas não custa repetir: filho não segura casamento.
Não deposite sua felicidade ou sua tristeza na criança que vai nascer. Sua felicidade não pode depender de outra pessoa que não você mesma. Se você acha que vai deixar de ser triste quando finalmente tiver um filho, prepare-se… vai piorar. Você vai ter mais responsabilidades, vai ter menos tempo para si mesmo, vai ter menos dinheiro para gastar consigo mesmo, e a criança não vai fazer o que você espera que ela faça. Se você fizer muitos planos, é bem possível que você se frustre vendo que nada daquilo vai se realizar. Ou pior: você vai frustrar a criança, obrigando ela a seguir o seu planejamento e suas expectativas e não a vida que ela mesma vai desejar.
Mas ser pai é uma experiência que eu sempre achei e continuo achando que vale à pena. Particularmente para mim, acho que me tornei uma pessoa bem melhor depois que errei muito nesse ofício. E continuo errando. Conheci uma moça que leu um monte de livros sobre como educar os filhos… eu não li nenhum, mas sou filho e sou pai. Acho que estas experiências devem nos orientar. A capacidade de reflexão e autocrítica também. No final, o tal do bom senso não vem de graça. Não se guie pela última tendência ou modismo. Se tem vontade de abraçar seu filho abrace. Se acha que determinados comportamentos são passíveis de punição, puna. Só não mude a regra no meio do caminho de uma hora para outra. Não ceda a chantagens ou choramingos. Uma coisa é analisar, rever e corrigir o rumo de algumas coisas. Outra coisa é não resistir a pressão ou se dobrar pela culpa. Você pode negociar um castigo por bom comportamento, mas não deve comprar o vídeo game novo sabendo que sua condição financeira não permite, não importa o quanto ele te pressione.
Mas tudo pode ser negociado. Dividir as responsabilidades na casa é sempre uma ótima opção. Dividir tarefas e responsabilidades é algo que deve-se fazer logo cedo. Não dá para fazer aquela super viagem? Sente com a família e avalie as possibilidades juntos. Discuta o que o orçamento atual permite ou não. Traga os seus filhos para o processo de decisão e compartilhe a responsabilidade pelo sucesso ou fracasso. Você não precisa ser o herói ou o vilão sempre. Da mesma forma, pagar os filhos para ajudarem na casa, ou para estudarem na escola é uma grande besteira. Os filhos devem estudar por eles mesmos, não pelos pais. É o futuro deles que está em jogo, não o seu. Passou de ano, parabéns! Não passou, problema seu. Seu filho não tem a obrigação de fazer doutorado, mas se não quer estudar, seria uma boa começar a trabalhar cedo. A não ser que ele tenha nascido para ser herdeiro. Eles devem ajudar em casa por uma questão de solidariedade, pois todos tem responsabilidades na casa, não apenas os pais. Quer fazer um bolo? Lave a louça depois. Quer andar de meia pela casa? Sem problemas, lave as suas meias.
Como dizia o Sr. Antônio Abujamra dizia para o seu filho: “Cada um tem o direito de estragar a sua vida do jeito que achar melhor”. O filho se tornou músico…
Meu pai foi pediatra e cresci ouvindo sobre como cuidar de uma criança envolvia em primeiro lugar em cuidar dos pais. Todo psicologo vai concordar que não adianta fazer terapia com uma criança se não tratar também dos pais. Tive pais excepcionais. Gosto de me gabar disso e gosto de pensar que as coisas boas que tive deles deveriam ser referência para mim como pai. Minha mãe não teve a mesma sorte, o meu avô era uma pessoa muito dura de uma concepção bem tradicional de educação. Ele também foi referência para a minha mãe, no sentido de não querer repetir os mesmos erros deles. Seja como for, a gente sempre tem uma referência, positiva ou negativa. A vantagem de ter uma referência positiva é que você já tem um modelo para seguir, já tem exemplos e acredita que é possível fazer isso dar certo. Assim como tem gente que acredita que a escola é sempre ruim, há quem acredite que não terá a capacidade de ser um bom pai. Então, seja qual a sua referência, acho que vale dizer que você nunca será tão ruim e nem tão bom quanto os seus pais. Será diferente. Você teve outras experiências, se casou (ou não) com outra pessoa que tem outra história e vive em outros tempos.
O quanto você vai se esforçar depende de você, mas tenha em mente que se você for uma pessoa infeliz, vai tornar a vida do seu filho infeliz também. Apesar de você ter seu direito à felicidade, você tem uma responsabilidade. Você não é obrigado a abrir mão da sua vida pessoal para o resto da vida (embora nos primeiros anos aconteça muito isso), mas tem uma responsabilidade da qual se espera que você não fuja. Tem gente que curte tudo, mas sinceramente, acordar com choro de madrugada, trocar fraldas, etc, dá trabalho e cansa. O grau de ansiedade e estresse da família faz toda a diferença nessas horas. Assim como tem gente que consegue passear com um cão tranquilamente pela rua, quase sem usar a guia, tem gente que é quase arrastado pelo animal. Os filhos tem algo parecido… a tensão familiar vai toda para a personalidade da criança. Se cuidar dela é uma tarefa angustiante para você, essa angústia vai fazer parte da personalidade da criança. Da mesma forma, se a criança se torna a única razão do seu viver, e tudo for lindo e maravilhoso, você está criando uma expectativa de que tem a obrigação de fazer tudo pela criança e adorar isso, para o resto da vida.
Me pai dizia que tanto o pai quanto a mãe ganhavam uma cartela com a palavra NÃO. E cada um vai usando com o tempo. Aquele que convive mais tempo com a criança acaba gastando a cartela primeiro, e depois que acontece, você pode dizer NÃO o quanto quiser, não vai mais funcionar como antes. Por isso precisa de parcimônia com tudo. Não dá para deixar uma criança brincar com o fogão por exemplo… mas dá para deixar ela tomar um choque na tomada… algumas coisas a criança pode experimentar por conta própria, como experimentar suco com sal ao invés de açúcar. Mas não dá para deixar ela atravessar a rua engatinhando. A importância de deixar a criança aprender sozinha é enorme. A frustração deve ser aprendida logo cedo. Mas a tirania deve ser sempre evitada. Bom senso não é fácil. O quanto você vai proteger e o quanto você vai castrar depende de você. Não existe fórmula correta. Pai e Mãe devem traçar acordos claros em relação a isso… não é nada fácil educar num ambiente onde pai e mãe tem visões muito diferentes nisso. Acordos devem ser estabelecidos antes de chegar na criança. Ela vai saber muito bem explorar essas diferenças. Quando ela quiser segurança ela vai procurar o castrador e quando quiser liberdade vai procurar o permissivo.
Outra coisa valiosa que aprendi com meu pai é a admiração pela forma como o Sr. Monteiro Lobato escreve para crianças: dentro do seu universo, elas são tratadas como adultos. Nada de mimimi e ficar filtrando tudo. Seja honesto sempre que puder. Tente explicar exatamente o que ocorre ao invés de inventar histórias. Não precisa iniciar uma criança de 4 anos nos horrores da segunda guerra mundial, nem matar o papai noel antes do tempo. Também não precisa proibir a criança de ver TV. Na verdade a questão é não inventar um universo à parte para a criança. Ela vai sacar logo do que você gosta ou não. Vai te imitar nos gestos e opiniões. Mas… não onde você espera. Se você bebe na garrafa, provavelmente ela vai te imitar. Se você gosta de música erudita, pode ser que ela não goste… Mas seja como for, tente explicar como as coisas realmente são, mesmo que ela não entenda tudo. A atitude é que faz a diferença. O seu esforço tem um significado importante: seus filhos sentirão que você tem uma relação de respeito elas. Esse negócio de ser outra pessoa quando veste o uniforme de pai é bem complicado. Trate-os como Monteiro Lobato, de igual para igual, não no que tange responsabilidades e papeis, mas no que tangue à capacidade intelectual. Seus filhos não são retardados, eles podem não ter um diploma de nível superior, mas você se surpreenderá com à capacidade de fazer relações com coisas do universo deles que eles tem. É mais… eles vêem TV, acessam a internet, conversam com os amigos da escola, vivem um monte de coisas que você não vai ter como acompanhar.
Cuidado com as receitas de bolo que dizem que existem etapas bem definidas para cada coisa. Se você se guiar por aí, vai ter a expectativa de que ele cresça em determinado rítmo, ande, fale, aprenda, tire as fraldas, largue a chupeta, etc. Tenho um primo que custou a crescer… os pais achavam que ele estava nanico e levaram num pediatra que indicou um especialista que fez uma mega bateria de exames e prescreveu uma super dieta rigorosa. Passaram alguns anos e ele não cresceu. Aí ele foi num especialista mais fodástico ainda, fez exames mais caros e detalhados e descobriu o óbvio. Ele não tinha nada. Ele só tinha um rítmo de crescimento diferente. Pararam com a tal dieta e os remédios. Hoje ele tem mais de 1,9m.
Mas tudo isso no final é uma grande besteira, parece um monte de recadinhos do facebook…. O importante mesmo, o fundamental, o cerne da questão, (vasculhando a caixa de chavões e letras de músicas impactantes), bom, eu não tenho a menor ideia. Um monte de gente deve achar que eu crio meu filho de forma completamente equivocada. Não tem regra que sirva para todos. Não se iluda procurando uma. Curta, os filhos são um companheiros diferentes de todas as namoradas, amigos e parentes que você já teve. Diferente do seus alunos ou subordinados. Diferentes até mesmos dos seus animais de estimação……
Vai lá e tenta. Curta. Erre. Torça! Preocupe-se. Chore. Erre novamente. Depois você me conta o que achou.