Janeiro

Janeiro é um mês estranho.

  • Depois da maratona de amigo-secreto, amigo-da-onça, amigo-ladrão e outras invenções para ajudar os donos de lojas de R$1,99;
  • Depois de todas a comemorações e bebemorações com os amigos, das festas promovidas pelo patrão, jantares formais e informais;
  • Depois de rever a família, relembrar todas as intrigas que os parentes conseguem carregar por meses a fio aguardando o momento em que todos estão lá reunidos e bêbados esperando a hora de lavar a roupa suja e fazer revelações perturbadoras;
  • Depois de desejar felicidades, fazer votos solidários, mandar o KIT FELICIDADES, entupir as caixas de mensagens com spans para amigos, inimigos, desconhecidos;
  • Depois de contabilizar todas as gafes, promessas não cumpridas, dívidas não pagas, amores perdidos, oportunidades que escorregaram e frustrações acumuladas;
  • Depois de aturar zilhões de especiais de natal, shows do Roberto Carlos, Xuxa e outras bizarrices que as TVs, Internet e camelôs insistem em irradiar pelo espectro, cabo, DVDs, Blue-Ray, pen-drive e o que mais inventarem
  • Depois de torrar até o último centavo do 13º (para quem ainda sabe o que é isso), bônus, cartão de crédito, cheque especial, agiotas e tudo o mais que lhe permita fazer um monte de parcelas em lojas entupidas de gente;
  • Depois de fazer promessas, traçar planos e estabelecer metas para o ano seguinte;
  • Depois de se matar no trampo para gastar todo o orçamento que seu chefe esqueceu de gastar no ano inteiro;
  • Depois de fazer todas as migrações, implantar todos os sistemas e tudo o mais que é necessário para que os outros consigam atingir suas metas que eles deixaram para lá durante 11 meses;
  • Depois de enfrentar um trânsito descomunal, filas intermináveis para comprar um simples perú e chuvas torrenciais na hora do rush;
  • Depois de se penitenciar/congratular/regozijar, pelo nascimento/morte/chegada/foo_event de alguma figura proeminente de alguma religião bar, lembrar e ser lembrado por todos à sua volta disso;

Bom depois de sobreviver a tantas provações, excessos e eventos cataclísmicos, tudo isso, chega o porre homérico do ano novo. Janeiro chega enfim como uma bonança há tempos esperada.

Enquanto muitos lotam as praias, hoteis, pousadas, castelos europeus, campings e outras acomodações, muitos continuam a trabalhar, mas não normalmente:

  • O trânsito se torna suportável, mesmo após as chuvas torrencias de verão;
  • Ninguém quer fazer migrações, implantações ou grandes mudanças nesta época;
  • O número de usuários cai incrivelmente, pois a maioria está lotando as praias, hotéis….
  • Os restaurantes estão mais vazios, as filas nos bancos e lotéricas estão menores;
  • A banda da Internet (pelo menos no trabalho) está uma maravilha!
  • Os radares continuam multando normalmente e aqueles que se empolgam com a diminuição nos engarrafamentos, não se lembram que existem limites de velocidade…
  • O tédio toma conta dos filhos que não foram viajar e atazanam a vida dos pais que mesmo com pouco trabalho e com pouco trânsito continuam chegando cansados do trabalho pensando naquela cerveja na praia…
  • A televisão começa a parar de passar retrospectivas, especiais de natal, reprises e coisa e tal e volta a exibir o mesmo lixo habitual;

Então janeiro é este mês mágico onde a insanidade de dezembro se encerra sem que no entanto as promessas de ano-novo se iniciem, uma vez que isso só passa a valer depois do carnaval. É aquele período mágico onde a tendinite acumulada em dezembro ainda o assombra, mas já permite que você abra a porta de casa sem arder infernalmente. É uma época em que alguns pais corajosos se aventuram a levar seus filhos em parques de diversões abarrotados de crianças com insolação e encharcadas de chuva ao mesmo tempo, lutando para conseguir ir em mais de um brinquedo no mesmo dia. Ok, eu confesso, levei meus filhos no tal do Hopi Hari tempos atrás e descobri que isso é tão idiota quanto querer levar a namorada/esposa/amante/secretária no motel no dia dos namorados/secretária sem reserva.

E cá estamos nós, tirando poeira do blog em pleno horário de expediente, lendo os quadrinhos excepcionais do André Dahmer na internet, lendo mais um livro do Douglas Adams na hora do almoço, marcando todos os seus Feeds/mails/tarefas de 2010/whatever como lidos e mergulhando naquela sensação pinkfloydiana de “Confortably Numb“.

Não é a euforia que poderia ser numa praia tomando todas com os amigos. Não é a calma de estar em casa assistindo uma eterna sessão da tarde. Nem tão refivigorante como um retiro nas cachoeiras de Lumiar. Mas é esse momento de suspensão onde nos permitimos um pouco de ócio produtivo, um pouco de delírio, um pouco de calma e um monte de dívidas para pagar.

Janeiro para mim é isso. De longe o pior mês do ano para se tirar férias, pelo simples motivo de todos quererem justamente isso. O melhor mês para implantar coisas que seu chefe boicota há tempos (afinal ele está de férias…). O melhor mês para ler coisas diferentes e ver filmes bizarros. E deixem janeiro passar sem pressa, como um domingo preguiçoso sem louça para lavar.

2 comentários

  1. Aaaah! Esquece. Todos os bugs, voltaram de férias mais cedo, as garantias dos hardwares venceram e as migrações tem de terminar antes do carnaval. Inferno!!!

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